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KATTY WINNE: “Enquanto a gente continuar lutando pelo direito de fazer arte, ela retribui"

Cantora e compositora alagoana é a terceira convidada da série “ARTE RESISTE” e abriu seu baú de recordações indie para o Mixtape 90

Katty Winne (Foto: Arquivo Pessoal)

É de uma infância cercada por guitarras e discos do pai, seleções musicais da mãe que iam de Titãs e Beatles à Legião Urbana e Cyndi Lauper que a música foi ganhando força na vida Katty Winne. Porém, a arte sempre esteve presente na vida cantora e compositora alagoana e é dessas experiências afetivas que ela constrói e reconstrói sua carreira até os dias de hoje. “Música para mim é tão natural quanto respirar. Sabe aquelas coisas que você só se dá conta que fazem parte da sua vida quando alguém te pergunta? A música sempre esteve.”

Adolescente apaixonada pelo “Love is Love”, programa de rádio alagoano com baladas românticas internacionais, e - como quase toda noventista – espectadora assídua da MTV, foi daí que a garota Winne começou a conhecer mais do seu universo paralelo. “O Disk MTV era o auge para mim. E as madrugadas eram mágicas. Descobri altas bandas legais que não costumavam passar nos programas durante o dia e que escuto até hoje”, relembra.

Foi a partir dessas descobertas, do autoconhecimento e da busca pela sua identidade artística que Winne segue até hoje fazendo e acreditando na música independente do Nordeste, mais precisamente em Maceió (AL). Apesar de passear por diversos gêneros alternativos, suas músicas têm inspiração no Shoegaze, estilo musical de indie rock marcado por guitarras distorcidas e sintetizadores que surgiu no Reino Unido no final dos anos 1980 e que foi popularizado pelos irlandeses da banda Bloody Valentine nos anos 1990.

Artista multifacetada com inspirações psicodélicas, góticas e extragalácticas Katty Winne ainda roteiriza e dirige seus próprios videoclipes, além de ser desenhista e também criar tirinhas que vêm trazendo conforto para o seu público na quarentena. A artista bateu um papo com o Mixtape 90 sobre carreira, música, planos, desafios da arte independente e ainda abriu seu baú pop em listas à lá “Alta Fidelidade”.

MIXTAPE: Winne, você tem trabalho que é bem diferente do que é produzido e consumido em Alagoas, no Nordeste e também no Brasil. Conta um pouco sobre como surgiu a música na tua vida.

WINNE: Eu lembro que lá pelos meus 10/12 anos, meu pai me emprestou uma coleção de CDs do Catedral e do Oficina G3 e eu devorava os álbuns um após o outro. Muito da minha fase roqueira - que nunca passou - vem daí também. Na adolescência, a MTV teve um peso imenso na minha vida. Bem nessa época, comecei a realmente querer aprender um instrumento. Costumava comprar revistas de cifra mesmo sem ter um instrumento, até que aos 19 eu ganhei um violão do meu padrasto. Depois meu pai me deu uma guitarra, e daí em diante ele vem me financiando com pedais. Valeu, pai!

Aos 19 entrei numa banda com uns amigos que se chamava Teen Spirit (oi, Nirvana!”). Nesse grupo, tocamos Pitty, Nirvana, Iron Maiden, Offspring e mais um montão de coisas que a gente curtia na época, lembro até que ouvia muito punk e hardcore também.

Em 2010, um amigo me chamou para tocar numa banda que tinha como influência bandas com Weezer - que continua uma das minhas favoritas do universo - Pixies e My Bloody Valentine. Foi aí que eu ouvi o “Loveless” do MBV e minha vida mudou. Eu pensei “PERA AÍ! ELES FAZEM ISSO COM UMA GUITARRA?!?!” hahaha Ouvi o álbum e a experiência foi tão linda que eu dormi: parecia que eu estava flutuando nas ondas sonoras. Claro que eu aceitei o convite e entrei na Slowdrop com uns amigos.

Muito do que eles me apresentaram naquela época me ajudou a dar forma ao que chamo de minha maneira de compor. Lancei um EP solo, com músicas meio Grunge e Folk. E percebi que não conseguiria bem me encaixar em um só estilo musical. Eu só queria fazer música e é assim até hoje.

Escritório criativo de Katty Winne (Foto: Arquivo Pessoal)

MIXTAPE: Quando e como surgiu a ideia de gravar as próprias músicas?

Em 2012, resolvi - depois de ouvir alguns conselhos - começar a gravar minhas músicas de uma maneira mais profissional. Como um dos meus melhores amigos, Márcio Junior, estava adentrando no mundo da produção musical, eu pedi para ser a próxima na lista de bandas que ele iria gravar.

Foi daí que veio o Molly Gun, meu primeiro EP. Ainda em 2012 eu me dei conta de que precisaria de uma banda, pois o EP estava saindo em alguns blogs. Tive a sorte de ter grandes amigos comigo na época, Iran Félix no baixo - que continua comigo na banda até hoje -, Márcio Junior - que continua como produtor da banda até hoje - nas guitarras e Junior Pinheiro na bateria. Foi assim que começou a saga de fazer Shoegaze. Só que não tínhamos pedais legais para isso, então nosso som era meio Dream Pop com Grunge. Com o passar dos anos e com as mudanças na formação, hoje me sinto bem mais próxima do som que sempre sonhei em fazer. Um som que particularmente é bem diferente, mas que tem seu público.

MIXTAPE: Sobre o Shoegaze, estilo de indie rock, como conheceu esse gênero? Quais as suas maiores referências?

WINNE: Eu conheci o Shoegaze como gênero lá em 2010, quando fui apresentada ao ábum “Loveless” do My Bloody Valentine. Esse disco mudou minha vida de diversas maneiras, pois despertou em mim, principalmente o amor pelos pedais de efeito.

O estilo tem essa coisa meio mágica de te levar aos lugares mais desconhecidos e despertar os mais diversos sentimentos. Depois de conhecer o My Bloody Valentine, eu parti para Slowdive, The Jesus and Mary Chain, Swervedriver, Starflyer 59, Ride, Cocteau Twins, Galaxie 500, Airiel e mais um monte de bandas.


MIXTAPE: Como está sendo o processo de criação durante esse período de quarentena?

WINNE: A quarentena me possibilitou uma jornada mais profunda e pessoal. Eu pude entender melhor os porquês do meu processo de composição, assim como me dedicar mais ao que eu queria aprender, como gravar e mixar, por exemplo.


Compor durante essa fase de REAL isolamento social (pois eu não saio de casa - e eu posso provar) já tem quatro meses, tem sido um mergulho dentro de mim, o que significa encontrar meus defeitos e qualidades e trabalhar mais neles. Eu pude também experimentar de maneira mais crua todos os sentimentos dentro de mim, afinal, o mundo está uma loucura e as coisas estão mais na cara agora, não tem o ruído do dia a dia, e tudo o que eu posso fazer é sentir e colocar isso nas composições.

Nessa quarentena gravei algumas versões covers e tenho umas demos de algumas canções, tanto para banda, quanto para meu projeto que é o Lemonoise Folkpie. Pude me dedicar também mais ao teclado, já que meus instrumentos são o violão e a guitarra. Como eu tenho um controlador, pude explorar os sons esquisitos no meio das músicas. Adoro experimentar sons. Acho que isso se dá também ao fato de crescer viciada em filmes e sempre adorei os efeitos sonoros.


Capa do single "Depression Love" (Foto: Divulgação/Instagram)

MIXTAPE: Você tem se mostrado uma artista multitalentosa que além de compor, cantar, produzir, também pinta, desenha e faz tirinhas nas redes sociais. Como está sendo essa experiência?

WINNE: A arte sempre esteve muito presente em quem eu sou. Eu sempre gostei de desenhar, só não me permitia usar cores, pois achava que elas “estragariam” o desenho. Até que no ano passado, um amigo sugeriu que eu deveria testar com cores. Comecei com lápis de cor, depois aquarela, guache e acrílica, depois misturando tudo.

Com a pintura, eu sinto que eu posso dar “forma” ao que eu sinto. Eu posso realmente ver e experimentar sensações que eu não conhecia. Eu ainda estou em busca do que é minha arte nessa área, mas ver que as pessoas gostam me dá vontade de continuar na busca. Aproveitei a quarentena para fazer uns cursos e aprender mais sobre o estilo de arte que faço nesse momento.

Quando eu passo quatro ou cinco horas pintando, o mundo ao redor desaparece e os pincéis se tornam uma extensão dos meus braços e as tintas meus sentimentos sendo colocados ali. Assim posso vê-los e tocá-los. A ideia de fazer as tirinhas foi mais para colocar nelas o que eu sentia sobre os mais variados temas. Eu achei legal a recepção das pessoas. Pretendo continuar em algum projeto no futuro.



MIXTAPE: Como é o processo de cantar em inglês por aqui? Você vê políticas públicas ou iniciativas para artistas independentes no Brasil?

WINNE: Como a maioria das músicas que eu curto sempre foram em inglês, cantar em inglês era mais fácil pela sonoridade das palavras. Mesmo que no começo eu nem soubesse como formar as frases direito. Ahaha

Eu acho que tive sorte de fazer parte de um coletivo em que a maioria das bandas cantavam em inglês. A Popfuzz abriu um espaço muito seguro para que os artistas pudessem ser quem eles queriam ser, fazendo o som que eles gostavam. No Brasil tem muita banda cantando em inglês. Porém, pessoalmente me cobrei que deveria ter ao menos uma música em português, espanhol, francês, etc. Ahaha Já temos algo em português, que vai sair no álbum em breve.

Claro que sempre tem aqueles que falam que deveríamos cantar na nossa língua pátria, mas sei lá, você faz o que você gosta e ponto. Sobre políticas e iniciativas públicas para artistas, elas existem. Mas do que sei mesmo é do corre dos artistas para conseguir o seu lugar ao sol.


MIXTAPE: Quanto à produção de videoclipes, como é trabalhar com o audiovisual independente por aqui?

WINNE: Bem, eu vi que existem ótimas produtoras por aqui, mas eu sempre fui muito underground. Ahaha Por exemplo, o primeiro clipe da banda foi bem: vamos pegar a câmera e ir na praia para gravar umas cenas lá. Aí eu mesma editei no Sony Vegas e pronto... Lançamos. Com o lançamento de “Depression Love”, a gente quis fazer um Lyric Video e aí foi do mesmo jeito só que mais underground ainda, pois gravamos no celular.

A gravação envolveu várias cenas que para mim faziam muito sentido. Eu acho que claro, uma mega produção seria ótimo, mas eu gosto dessa coisa mais “vamos usar o que a gente tem”. Produzir as músicas em casa sempre foi uma realidade para mim. Com a banda, a gente gosta muito de produção caseira, de ver acontecendo, além da gente ter sorte de ter amigos que produzem e que gostam do nosso som. É como se sentir “seguros” e inspirados a estudar mais sobre produção e entender melhor como funciona. Muitas bandas daqui assinam as suas gravações e eu acho muito interessante. São grandes bandas com muito material bom.



MIXTAPE: Sobre a situação da cultura no Brasil de hoje... Você acha que a arte resiste?

WINNE: Imagine a arte como algo que salva vidas. Bom, é isso que ela significa para mim. A arte é capaz de ir a lugares inimagináveis. Ela sai de você para o mundo e sabe-se lá o poder que ela tem na vida das pessoas. Eu falo por mim quando digo que a arte salva.

Cada um deveria parar e se perguntar: o que a arte fez por mim? E lembrar que os artistas, independentemente do tipo de arte, estão sempre dando um duro danado para que eles possam se expressar e fazer aquilo que amam. Essa arte chega até você e te move de algum jeito. Enquanto a gente continuar acreditando e lutando pelo direito de fazer arte, ela retribui em forma de pequenas e grandes batalhas vencidas.


MIXTAPE: Há alguns coletivos culturais em Maceió (AL) e também a produção alagoaníssima do Festival Carambola. Você enxerga um bom futuro para a música alternativa do Nordeste?

WINNE: Na verdade eu sempre enxerguei um bom futuro. Logo no primeiro EP eu tive a sorte de ter um coletivo comigo e ele me levou bem longe. Sempre tem gente disposta a ajudar os artistas a divulgar sua música, as bandas costumam ter suas diferenças, mas no geral estão sempre em contato e se ajudando.

Espero que os coletivos sejam mais unidos e possam abrir portas para todos os gêneros musicais, que diversos festivais possam ser feitos futuramente incluindo todos os artistas. Aqui em Alagoas, a quantidade de artistas é incrível e a diversidade é maravilhosa. Meu sonho é ver essa cena acontecendo para todo mundo.


MIXTAPE: Quais os próximos passos da carreira da Banda Katty Winne?

WINNE: Lançar o tão esperado álbum, isso eu falo por nós da banda (Hehe) Também vou abrir minha lojinha agora esse mês para vender minhas pinturas (fica a dica! Haha) e me dedicar muito nas coisas que eu amo, falo da arte no geral. Quero continuar pintando, criando tirinhas, fotografando e, claro, continuar fazendo música. Lançar mais álbuns e ir para onde a arte me levar. Sem arte eu não existiria, nem para mim mesma.


MIXTAPE: Ao final de cada entrevista, a gente pede que sempre deixe uma mixtape para nosso público indicando obras que fazem ou fizeram parte da vida. Quais são as suas?

WINNE: Agora é o meu momento! Yay! hahaha Vou deixar minhas listinhas (quem me conhece sabe que eu adoro fazer essas listas). Espero que gostem! Muito obrigada pela oportunidade! Beijos e viva a arte!

TOP 10 álbuns (TRISTES) favoritos

Weezer - Blue Album

My Bloody Valentine - Isn’t Anything

Slowdive - Just For a Day

The Cure - Disintegration

Elliott Smith - New Moon

The Bilinda Butchers - Heaven

Daughter - If You Leave

Jessica Lea Mayfield - Make My Head Sing

Sea Oleena - Shallow

Phoebe Bridgers - Punisher

TOP 10 livros favoritos

A Desumanização - Valter Hugo Mãe

O Planeta dos Macacos - Pierre Boulle

1984 - George Orwell

A Revolução dos Bichos - George Orwell

Lua de Larvas - Sally Gardner

Mamãe & Eu & Mamãe - Maya Angelou

Misery - Stephen King

It - Stephen King

O Sol é Para Todos - Harper Lee

A Metamorfose - Franz Kafka

TOP 10 filmes favoritos

Sleepy Hollow (1999)

The Texas Chainsaw Massacre (1974)

Rosemary’s Baby (1968)

The Exorcist (1973)

Eternal Sunshine of Spotless Mind (2004)

The Bridge of Madison County (1995)

Moonrise Kingdom (2012)

Paterson (2016)

The Good, The Bad and The Ugly (1966)

Rear Window (1954)

TOP 10 Documentários

Heaven Adores You

Heima

Don’t F**k With Cats

Evil Genius: The True Story of America’s Most Diabolical Bank Heist

Amy


Blackfish

Abducted in Plain Sight

Conversations with a Killer: The Ted Bunny Tapes

The Devil and Daniel Johnston

The Blues

Katty Winne é uma cantora, compositora e desenhista que acredita no poder transformador da ARTE.


Twitter: @winneverse
Instagram: @winneverse
Youtube: Katty Winne Band

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